25 Out Guia Prático da Perda Total
Guia Prático da “Perda Total”
O presente guia apenas é aplicável nos casos em que a responsabilidade do acidente é de um terceiro (de outro dos intervenientes no acidente), uma vez que, nos casos de perda total nas situações em que foi o próprio o responsável pelo sinistro e activa o seu seguro de danos próprios (comummente designado “seguro contra todos”) existem outros factores a ter em conta.
Normalmente quando é que a companhia de seguros (seguradora) considera o veículo uma “perda total” ?
Habitualmente para uma companhia de seguros ( seguradora) um veículo interveniente num acidente considera-se em situação de perda total, quando se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado ao valor do salvado, ultrapasse os 100% ou 120% do valor venal do veículo imediatamente antes do sinistro, consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de 2 anos – alínea c) do nº1 do art. 41º do citado Dec- Lei 291/2007 ( texto retirado de uma das muito cartas tipo que as companhias de seguros enviam nestes casos)
Perante o cenário de Perda total referido supra, qual o procedimento das companhias de Seguro (seguradora)?
Habitualmente, após a companhia de seguros declarar que o veiculo está no estado de perda total, fundamenta o valor de mercado do veículo antes do sinistro( valor venal), através de pesquisas ao mercado, assim como consulta das tabelas de desvalorização e por consulta a empresas do sector, como a Eurotax ,
Normalmente informa ainda que o valor do salvado (veículo sinistrado) terá actualmente um montante que foi apurado perante um qualquer parceiro e por isso a indemnização que o sinistrado deverá receber é a do valor venal, diminuindo o valor do salvado ( veículo sinistrado).
Por fim, informam de que o parceiro que determinou o valor do salvado, terá interesse em adquirir o mesmo pelo valor que o próprio avaliou.
O sinistrado terá de aceitar a posição da Companhia de seguros (seguradora)?
Antes de mais importa que nesta fase estamos numa fase de negociação, pelo que tudo o que for transmitido pela companhia de seguros ( seguradora) não tem caracter vinculativo para o sinistrado, tirando que implica uma vontade negocial.
Começando logo pela situação de perda total, o sinistrado não tem de aceitar que o seu veiculo seja uma perda total nem que a definição de perda total é a que consta da carta recebida da companhia de seguros ( seguradora), pois a mesma não é a que resulta da lei, conforme se irá explicar mais à frente.
Mesmo aceitando que o veiculo está em perda total, o sinistrado não é obrigado a aceitar o valor atribuído como valor venal ( valor do veículo no momento imediatamente anterior ao sinistro), ou seja não terá de aceitar o valor da indemnização proposta.
Existe algum conceito legal para perda total diferente do indicado pelas companhias de seguros (seguradoras)? Qual é?
No nosso entendimento, fortalecido por um movimento jurisprudencial, é aplicado a este tipo de questões o conceito de restituição natural ao estado imediatamente anterior ao do dano (sinistro), como se o mesmo não tivesse existido.
Ou seja, perante um dano (neste caso o sinistro), o causador do dano ( o responsável pelo acidente que transferiu a sua responsabilidade para a seguradora) deverá repor a situação como se não tivesse existido qualquer tipo de sinistro.
Isto quer dizer, que perante um dano (provocado pelo sinistro), para além de outras indemnizações devidas, as companhias de seguro (substituindo-se aos causador do dano, por via do contrato de seguro) deverão restituir o bem ao estado que o mesmo estava antes do sinistro (acidente).
Excepcionam-se os casos em que não é exigível a reparação do veículo (restituição natural), sendo substituído por indemnização em dinheiro, que visa eliminar o prejuízo sofrido pelo sinistrado perante um dano que não causou.
No fundo, em qualquer uma delas estaremos perante a situação legal equivalente ao conceito de perda total utilizado pelas companhias de seguro (seguradoras)
- Quando a restituição natural não é possível por qualquer motivo;
- Quanto essa restituição não repare a totalidade dos danos, ou seja, quando não seja tecnicamente possível a reparação ou pelo menos, não seja expectável que o veículo volte a adquirir todas as condições de segurança e para cumprir o fim a que se destina;
- Seja excessivamente oneroso para o devedor (neste caso a Seguradora em substituição do seu cliente);
Como poderemos verificar, não existe uma definição legal de perda total, até porque o princípio, aplicado nesta área, é o de que as companhias de seguro (seguradoras) são obrigadas a reparar os veículos.
Apenas não o terão de o fazer, caso se verifique qualquer uma das três excepções supra mencionadas, cabendo à companhia de seguros alegar e provar que o veículo se encontra numa destas excepções e assim, em “perda total”.
Ora, se as duas primeiras que são objectivas e pensamos que não impliquem qualquer tipo de interpretação, já na terceira poderá existir o equivalente legal ao conceito de perda total em razão do valor, conforme as companhias de seguro normalmente atribuem.
Da leitura da lei e da jurisprudência aplicável, verificamos que não existem qualquer tipo de patamares ou valores a partir do qual se pode considerar que é extremamente oneroso para o devedor (as companhias de seguro) proceder à restituição natural, até porque nesta avaliação terão de entrar em conta não só elementos financeiros, mas igualmente , outros valores, como eventuais apegos emocionais, danos morais e outros ao veículo em questão pelo sinistrado.
Qual a indemnização devida caso se aceite que a restituição natural não é possível ( ponto 1 e 2) ou que é demasiada onerosa para o devedor ( ponto 3)?
O critério legal de reparação deste tipo de dano é que o sinistrado não deverá ter o seu património diminuído tendo em conta o dano registado.
Isto quer dizer, na nossa humilde opinião, que não bastará olhar para o lado financeiro, uma vez que o veiculo , para mais das vezes, implica oportunidade de deslocação, de trabalho, de lazer, de transporte de familiares, de amigos, entre outros direitos de gozo.
Ora, ao atribuir um valor financeiro a um veículo por mera oposição de tabelas ou especulação atribuída por uma qualquer empresa externa e indemnizar o sinistrado neste montante, pode não ser suficiente , assim como tem sido entendimento jurisprudencial, que o dano provocado fique colmatado.
Sendo impossível a restituição legal ou a seguradora tomando a decisão de não proceder à reparação por considerar que é demasiado oneroso, deverá pagar uma indemnização que permita ao sinistrado repor, na sua amplitude máxima, o dano (não só financeiro, conforme supra se referiu) provocado pelo sinistro.
Existindo vários critérios para se chegar ao valor de indemnização, segundo nós, só após avaliação de todos eles, nomeadamente, dos que supra indicamos, é que se estará em condições de avaliar se a reparação é exigível e em caso de indemnização, se a mesma é suficiente para reparar o dano na esfera jurídica.
Conclusão
Nada neste guia pretende afirmar que as companhias de seguros (seguradoras) tentam enganar os sinistrados, mas somente deverá servir para base para uma negociação mais equilibrada e esclarecida entre as partes.
Importa referir que deverá sempre consultar um advogado para aferir da legalidade na sua situação específica, assim como coadjuva-lo na negociação e eventual processo com a companhia de seguros ( seguradora)
Neste guia não estão contemplados, nem referidos outros tipos de direitos que poderão estar contemplados na esfera do lesado, conexos com esta situação, pelo que deverá consultar um advogado para ser informado de outras eventuais indemnizações e direitos que possam eventualmente ser-lhe atribuídos.
Pedro Hassam – pedro.hassam@ssehf.com